terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O Diário de Batonelli - Relatos de Uma Amizade Perneta




São Paulo, 25 de dezembro de 2001.

Querido diário!

Não. “Querido diário” é muito feminino.
Vou te chamar apenas de “diário”. Fica mais adulto. Firme.
E também não há motivos para que eu te “chame” por algum nome, afinal de contas, um caderno não compreende nada do que os humanos escrevem nele.
Quem lerá isto tudo depois será eu: Wendell, o próprio.
Eu poderia começar com “Querido Wendell”, mas sei lá. É muito estranho conversar comigo mesmo através de algumas folhas de papel.
Nesses casos, geralmente, eu uso o espelho.

Para iniciar esse registro, devo começar contando do dia em que eu o encontrei no quarto da Marina ontem de manhã, depois que cheguei do campinho de futebol.
Era a véspera de hoje. A véspera do natal.

O natal é uma data especial.
Eu quis dizer: o natal é uma data comercial.

O natal é uma data caridosa. E seria a única do ano?
O natal é injusto, isto é!

O natal é muito mais do que uma reunião familiar entre parentes distantes, antipáticos ou que, de tão simpáticos, tornam-se chatos.
O natal é muito mais do que presentes embaixo de uma árvore enfeitada com bolas brilhantes daquelas que mal cabem na sala, luzes pisca-pisca coloridas ou enfeitezinhos bonitinhos.
Natal é muito mais do que um Papai Noel de barba falsa sentado em shoppings espetacularmente produzidos para atrair consumidores; muito mais que um simples velho gorducho carregando um saco vermelho cheio de presentes comprados por nossos próprios pais.

Comprar. Comprar.
Gastar. Gastar.
Consumir. Devorar...

Este é o natal que conhecemos.

Diário, escrevi esse resumo sobre o natal de uma forma poética.
Aprendi coisas legais na escola neste ano que se finda.
Sou ótimo em redação. A professora de português, Dona Val, é quem diz! Espero que ela continue lecionando na quinta-série...

Entretanto.
É estranho, mas eu deveria estar feliz com o natal nesses moldes capitalistas, afinal de contas, tenho nove anos de idade e o que eu mais gosto é de ganhar presentes. Tanto faz se é no natal, no dia das crianças, no meu aniversário ou qualquer outra data que favoreça o gasto salarial de nossos pais.

Ontem eu ganhei um carrinho de controle remoto.

Legal. Eu me esforcei a sorrir diante do meu pai. O coitado estava mais feliz do que qualquer um naquela sala. E olhe que gastou mais da metade de seu décimo terceiro com as traquitanas natalinas, comes e bebes da ceia e um carrinho de controle remoto vermelho, cheio de detalhes e com uma etiqueta miúda contendo o preço (R$ 249,99) raspado com dificuldade. Talvez mamãe quisesse retirar o adesivo, mas vejo que não conseguiu.
Que fique bem claro, diário: eu não pedi este presente.
Eu queria um simples pião ou uma pipa sem linha que voasse com a força do pensamento, piruetando ao vento.

Já inventaram pipas assim?

Acho que não. Talvez por isto o meu pai tenha opinado trocar 250 reais (esse povo complica com os quebrados de 99 “vírgula” 99) por um brinquedo sem fio que anda com a força do pensamento de uma bateria alcalina.
O pião ou a pipa sairiam mais baratos. A última pipa que comprei custava menos de 30 centavos no bazar da esquina. Mas meu pai diz que é perigoso demais.
O que há de tão perigoso em uma pipa voando e um garoto feliz a direcionando?
Pensando bem, acho que o perigo está é quando elas despencam.
Ontem à tarde o Bruninho da rua de baixo brigou com o Luiz quando ambos agarraram a mesma linha, ao mesmo tempo, e berraram juntos:
“Ta na mão”
A porrada comeu solta e a pipa estava na mão é do Jorjão, o garoto mais velho da vila de baixo. Ele também gosta de pipas.

Eu ainda gosto de pipas. E também de brinquedos mais simples que, como dizem meus avôs, divertem mais que os vídeo-games de hoje. Eu concordo com eles...

Pensei em trocar o meu carrinho de controle remoto com o jogo de damas que meu primo ganhou da minha avó.
Meu primo se chama Roberto. E ele ficou feliz quando estava tudo decidido.
O jogo de damas ainda estava embrulhado, pois ele já sabia que o ganharia. Ele se entusiasmou quando eu quis trocar pelo meu presente desembrulhado, mas meu pai não deixou.
Acho que é porque foram presentes dados com muito carinho... Ou porque o meu custou caro mesmo! Mas eu ficaria feliz em ganhar um jogo de damas.
Minha avó me deu um par de meias. Eu realmente estava precisando.
Roberto, que tem a mesma idade que eu, chorou durante toda a ceia de natal, emburrado em um canto enquanto a tia Sônia dizia que “Nunca mais passariam o natal em casa”. Acho que ela ficou um pouco estressada com todo aquele burburinho, com todo aquele gasto de fim de ano.
Ela me deu um bonequinho do Batman. O preço na caixinha era mais sublime que o contido em meu carrinho de controle remoto: R$ 2,99 apenas. Tava raspado também. Os adultos não conseguem tirar as etiquetas com preços e deixam lá, pensando que nós, crianças, somos burras o suficiente para não entender que se trata do custo da nossa diversão e do prejuízo que as datas comemorativas mais aguardadas causam a eles.
Não consigo me imaginar adulto...
E vou ser bem sincero: ainda não tirei o carrinho da caixa.
O Batman já batalhou contra meu exército de super-homens. Aliás, o Batman daquela noite de natal fora o segundo brinquedo barato que eu ganhara em toda a minha vida. Talvez o terceiro...

Tá bom, exagerei, mas:
Ou minha tia ficou pobre ou meu pai é quem ficou rico?
Não tem nem um dia de vida, mas já é o meu brinquedo favorito.

(Rimou! – não foi proposital).

Inclusive, este super-herói de plástico fez-me companhia durante a maior parte do tempo neste feriado solitário. Os brinquedos mais baratos me parecem mais divertidos... Roberto diz que eu sou bobo e que, se pudesse, trocaria todos os bonecos de 1,99 dele por meus carrinhos de controle remoto e outras tecnologias importadas! Eu até aceitaria, mas meu pai jamais permitiria...

Depois do almoço em família, meus primos e parentes foram embora.
Uma pena eu não poder jogar damas em meio ao vácuo que este dia deixou: meus amigos – todos, praticamente, dos poucos que tenho – estão aproveitando as férias em outro lugar. Por isto tenho que aguardar até amanhã para fazer o mesmo e um joguinho daqueles seria um ótimo passatempo. Minha mãe disse que no meu aniversário comprará um jogo de xadrez, mesmo eu insistindo que eu quero é um de DAMAS...

Que tédio.

Por enquanto, diário, vou ficando por aqui. Já são onze e meia da noite (vinte e três horas e trinta minutos para ser mais exato) e ta na hora de dormir, ainda que o sono não tenha chegado.
Estou ansioso em passar o resto das férias no sítio do meu avô.
E estou feliz em ter estreado estas folhas suas, diário, que um dia a minha irmã estrearia.

Até amanhã, pois hoje eu já escrevi demais!

...

Olá.
Aqui quem vos escreve é o leitor.
Em paralelo ao diário do personagem, relato nas entrelinhas o desenvolvimento da incrível história de amizade entre um menino e um “saci” e sua tamanha compatibilidade familiar.

Wendell Batonelli.
Ele, definitivamente, não é um garoto “normal”.
Seus pais: Vera e Arthur acreditam que o filho tenha habilidades especiais; um garoto superdotado na família. O único.
Com apenas nove anos de idade, Wendell era o número um de sua classe escolar. Cursava a quarta série do primário, sentava na primeira carteira da segunda fileira do corredor que dava à frente da mesa dos professores, e suas provas, na grande maioria das vezes, vinham estampadas com um dez de extrema excelência. O “CDF” da sala, como dizem. O mais cobiçado, o mais amado, o mais cobrado... O mais, o mais...
Mas “grandes poderes requerem grandes responsabilidades”. Poderes.
O seu poder era poder mais do que oitenta por cento de alunos da Quarta Série 2, turno matinal, da Escola Senador Armando Cunha podiam.
Certo. Nem ele mesmo entende esse seu dom de se dar bem nas provas e no carisma da grande maioria, até porque o “fundão” detesta a sua conduta de bom moço. Pelo menos se livrou das práticas bullying de Henrique, o valentão da quarta série que continuará com esta denominação enquanto o restante da turma cursaria a quinta série no ano seguinte. E faltavam poucos dias para o ano novo. Um pouco mais para o retorno às aulas. Fato.

O restante de férias seria compensado no sítio de Durval, o avô que esquecera o presente do neto em Minas Gerais, na roça, e para compensar o erro, juntou algumas moedas e trocou por um par de meias na primeira loja que viram aberta na noite em que ele e a vovó chegaram a São Paulo para o natal. O presente de Roberto, o primo, fora o jogo de damas; o de Aline, a prima de dezesseis anos, uma Barbie. É claro que a menina detestou. Em sua idade, a boneca já não fazia parte das brincadeiras. Mas os avós sempre a considerariam uma criança.
Laís, a prima de dez anos, irmã de Ailton, dezessete, ganhou uma bolsa colorida, com estampas floridas que iam das alças às laterais. Mais tarde, trocou-a pela Barbie da prima. Ailton, por sua vez, ganhou uma camiseta do clube de futebol Atlético Mineiro e recusou-se a aceitar quando o avô jurava acreditar que ele torcesse ao time alvinegro.
— Não, vô! Sou corinthiano...
A cara de espanto de Durval era notável ao fitar o mesmo olhar furtivo e errôneo de Dona Armênia, sua esposa de longa data.
— Confundi. Times semelhantemente monocromáticos! – não soou como uma ofensa, mas o neto frustrou-se.
Rapidamente mudaram de assunto. Os presentes naquela noite não estavam tão certeiros. Talvez o motivo tenha sido o ano conturbado que se aproximava do fim. Bagunçou a cabeça de todos.

– MEMORANDO –
Wendell ganhou um carrinho de controle-remoto do pai;
Roberto ganhou um jogo de damas da avó.
Os dois foram proibidos de trocarem os presentes e o primo chorou a noite inteira.
Aline ganhou uma Barbie que logo fora trocada pela bolsa de Laís.
E Ailton ganhou uma camiseta de um time que não torcia.

Foram estes os presentes mais equivocados de todos os natais!

Para exemplificar as coisas:
Wendell é filho de Vera e Arthur, e irmão de Marina (a história dela será contada dentro em breve).
Tia Sônia é irmã de Vera e tem dois filhos: Roberto, de nove anos e Aline, de dezesseis. É casada com Aroldo, que não estava presente na ceia por conta do serviço de vigia em um condomínio na zona sul. Estava de plantão naquela noite em mais um natal longe da família.
Tio Tobias é casado com Carmem e tem três filhos: Laís, Ailton e Andressa, de vinte e três anos (ela ficou alguns minutos na casa da tia Vera, mas rapidamente saiu com o namorado Victor – sem ganhar presente, diga-se de passagem, apenas vovó comentou que compraria algo pra ela na manhã seguinte).
Simplificando mais ainda (ou confundindo):
Vovô Durval e vovó Armênia tiveram cinco filhos, dentre os quais apenas Vera, Sônia e Tobias estavam reunidos naquela ceia. Os demais: Regina e Durval Junior não compareceram.
Regina é viúva e tem quatro filhos: Breno, dezoito anos, Gustavo, quinze, Francielle, doze e Marília, sete. Moram em Varginha, Minas Gerais, a alguns quilômetros do sítio dos pais, em Cambuí. Apenas Breno mora em Curitiba e batalha para conseguir alguma bolsa de estudo em alguma faculdade. Regina é a filha rebelde de Durval e Armênia. Orgulhosa e egoísta, detesta os irmãos por achar que eles a consideram uma pessoa desprezível. Coisas de família. Vai entender!
Durval Junior mora no exterior, em Londres, na Inglaterra há exatos quinze anos, após conhecer e engravidar Mary Lane, uma britânica que fazia intercâmbio em uma famosa agência de turismo de São Paulo. O rebento deles é Jeffrey, quatorze anos. Esteve no Brasil apenas duas vezes após residir na Europa. Em uma delas, Jeffrey o acompanhou e conheceu os avós, os primos e tios. Isto quando tinha onze anos.
Regina bajula Durvalzinho desde pequena, mas Sônia, sua irmã mais velha, insiste em acreditar que a ovelha negra esteja mais interessada no dinheiro do irmão do que na amizade fraterna propriamente dita. Está aí uma das causas do conflito familiar que ronda os Batonelli...

Espero que a simplificação tenha ajudado.
A família não chega a ser tão grande, mas a imensidão da relação entre eles é que complica.
Wendell conta mais de sua convivência conforme avança as páginas de seu diário; e dispus-me a ler seu cotidiano rabiscado em letras miúdas e desenvoltas no minúsculo caderninho rosado.

Obs: O garoto encaparia o diário com uma folha azul-marinho em dois dias.

Desculpe-me a curiosidade e impaciência.
Cocei a mão de vontade em querer saber qual é o desfecho da crônica final. E realizei esse desejo insaciável, mas a última página estava em branco.
É claro que já terminei a leitura completa, mas esta coceira me ocorreu após a leitura de, mais ou menos, cinco datas descritas no diário. Eu já sei o final. O meio e o começo também. Aliás, sei de coisas que vão além do imaginário do inocente Wendell. Coisas estas que se esvaíram em seu subconsciente. Coisas que não foram anotadas.
Eu sei.
Para que você entenda o que quero dizer, deve saber primeiro o que o menino escreveu no segundo dia de sua aventura inicial.
Posteriormente, os fatos se tornarão claros.
Basta um vislumbre pelo mundo surreal que o garoto criou dentro do contexto fantástico de sua vivência no interior de Minas Gerais:
“Finalmente, as férias propriamente ditas!”
Palavras do autor.
Eu só quis antecipar a euforia proposta logo ao início da prosa no segundo relato do garoto.
O caderninho pareceu brilhar quando li estas páginas:

Cambuí, 26 de dezembro de 2001.

Diário.

Finalmente, as férias propriamente ditas!

Hoje eu acordei feliz. Depois de tanto rolar na cama te observando no escuro e imaginando o que eu escreveria neste dia tão especial...
Acordei nove horas da manhã. Se minha mãe não me sacudisse, com certeza eu acordaria mais tarde. Mas ela não faria isto comigo, afinal de contas, enchi os ouvidos dela por um longo tempo com pedidos frequentes de que eu pudesse passar as férias de fim de ano no sítio do vovô Durval.
Eis me aqui. Estou respirando o mais puro ar mineiro.

Adoro esse lugar: Cambuí, Minas Gerais.
Notou o cabeçalho?

Saímos de São Paulo às 10 horas e 30 minutos.
A rodoviária do Tietê nunca me proporcionou fascínio... Até esta manhã!

Foram as duas horas de viagem mais curtas da minha vida.
Nunca desejei tanto estar nesta cidadezinha.
No fundo eu sei que algo nela me atrai. Não sei se é o verde, as montanhas, as cachoeiras, a hospitalidade. Sei lá.
Só sei que ela nunca me pareceu tão atraente!

Você, diário, não consegue ver, mas eu não consigo parar de sorrir.
Pareço um bobo.
Quando olho da janela do quarto para as montanhas, sinto-me intensamente vivo.
Poucas pessoas têm esse privilégio.
Estou aproveitando cada segundo.

No momento, grilos fazem serenata no terreno. Já é noite.

A primeira coisa que fiz quando cheguei foi comer o bolo de fubá da minha avó. Ela insistiu em fazer um novo, mas não resisti àquele delicioso pedacinho de céu que encontrei num recipiente em cima da mesa. E amanhã terá pão de queijo! Uau!
Depois, fui até a gruta na parte baixa do sítio. Vovô Durval me levou até lá.
Chupei manga diretamente do pé. Que delícia.
Fiz tanta coisa, que não sei se caberia aqui. Se eu não parar, transformo-te em livro, diário.

Hoje, no jantar, comi uma sopa de quirela. Eu não gosto muito, mas vovó Armênia sabe conquistar meu paladar.
Não vejo a hora do almoço de amanhã chegar.
Comida mineira feita por minha avó, não tem igual.
Ela me prometeu um feijão tropeiro do jeito que eu gosto: bem temperado! Hummmm... Já consigo sentir o gosto.
Ah! A sobremesa será doce de leite com geléia de morango.

Sinceramente, eu estou no paraíso.

Não preciso simplificar tanta coisa. Minha emoção em estar neste pedacinho de céu já diz por si só.

Vou ficando por aqui.
Quero dormir rápido para que amanhã chegue logo.
Quando o galo cantar, quero estar de pé!

Até amanhã!

Continua...

POR RICARDO MICHILIZZI

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

[conto/prólogo] A Queda Imprecisa


Eu tenho uma coragem insuportável. Vou onde estiver o perigo. Como posso? Que mania besta! Ora, a esta altura eu deveria estar apodrecendo no solo infértil, devorado pelos vermes mais asquerosos, decomposto dentre as entranhas deste planeta imundo; mas não. Eis-me aqui: vivo. Em queda-livre. Discutindo comigo mesmo os rumos incertos de minha vida. Aliás, que vida é essa? Eu não amo ninguém, não sou amigo de ninguém, nem mesmo consigo me amar, não sou meu próprio amigo! Sou levado insaciavelmente à morte a todo o momento. E não morro. Constantemente carregado à ruína munido de um desejo absurdo – o desejo de sentir medo. Mas não sinto.
O que sinto então? Apenas desejo, eu sei. Mas é um desejo inquietante e corrosivo. Eu deveria temer a morte, como qualquer ser vivo temeria, presumo. Como um dia temi, lembro-me disso. Mas não a temo mais. Nada mais temo. E por isto busco descontroladamente algo que possa me satisfazer, mas as consequências são minhas cicatrizes e anomalias. Se alguém me visse perambular adentro aos destroços do derradeiro apocalipse, certamente confundiria a mim o anticristo. Não sou. Não sei quem ou o que sou. Meu corpo está deformado. Tantas foram as tentativas de me amedrontar com algo. Desde as mais simples torturas às mais complexas mutilações. Meu corpo não é mais o mesmo. Meu rosto...
Quem eu sou, afinal? O quê eu sou? Respostas. Onde encontrá-las? Não há. Não sei meu nome. Costumo me auto-intitular “Lecsi”. É a marca, o nome ou o slogan da maioria das serras cravadas em minha pele. Todas elas se adequaram ao ambiente. Não ouso em retirá-las. A dor é imensa. Sim, eu sinto dor. Mas do que adianta senti-la se não posso temer o momento precedente? Se eu sentisse medo de sentir dor, certamente retiraria todos os estilhaços, metais, serras, lanças e outras porcarias que eventualmente se hospedam neste corpo inútil e ambulante. Ou quem sabe nem os teria instalado. Mas não... Eu quero o medo. Sentir o medo. Viver o medo! Enquanto isto não acontece, sinto o vento empurrar-me de volta para cima ao mesmo tempo em que meu corpo, mais pesado e indiscutivelmente mais rápido, despenca numa velocidade inacreditável.
Sim, saltei de um gigantesco penhasco onde anteriormente residia uma cachoeira. Pensei que, desta vez, sentiria medo. Eu nunca havia executado este tipo de salto. Sempre ouvi dizer que a primeira vez é inesquecível. Prefiro esquecer. O medo não veio. E depois de tanta automutilação, percebo que não morro assim tão fácil; nem tão difícil. Na verdade, acho que não morro. E não, não consigo “preparar-me” para atingir o solo. Seria normal eu temer o impacto. Seria normal eu partir deste mundo. Mas nada mais é normal como costumava ser antes do fim...

POR RICARDO MICHILIZZI

domingo, 8 de novembro de 2009

A Sereia de Sal



sal sm. 1. Cloreto de sódio, cristalino, branco, usado na alimentação. 2. Fig. Graça, vivacidade. 3. Fig. Malícia espirituosa.

sereia sf.1. Ser mitológico, metade mulher, metade peixe. 2. Fig. Mulher sedutora.

sereia de sal sf. 1. Criatura marítima com aparência feminina, metade mulher, metade peixe, que pode transformar-se em pó (sal) e dissolver-se na água. 2. Fig. Transmuta-se; transforma-se (tem o poder de transmutação, podendo aparentar-se a qualquer humano, animal ou até mesmo a um ser inanimado). 3. Fig. Mulher (criatura) sedutora.

_Fonte: dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (2009);

Sereia de Sal

“Acredita-se que exista apenas uma Sereia de Sal e que ela viva em alto mar na região portuária do Oeste. Normalmente associada à lenda de Groto, O Âncora, a criatura ‘metade humana, metade peixe’ seduz homens ligados, de alguma maneira, à traição – eis aí resquícios do paralelo entre uma história e outra – arrastando-os ao mar e afogando-os nas profundezas das águas salgadas.
Algumas pessoas acreditam na possibilidade de a sereia ter ‘nascido’ décadas (ou talvez séculos) antes de Ernesto Groto existir, criada por algum mago pirata quando a traição era recorrente entre marinheiros e viajantes. Outros dizem que ela nasceu das águas, uma vez que é constituída de sal e adaptou-se à sina d’O Âncora, angariando um motivo recorrente para seduzir homens à morte, tamanho seu encanto e beleza. Ambas especulações não têm sua veracidade comprovada, uma vez que estamos tratando de lendas.
Por poder transmutar-se em qualquer ser vivo ou abiótico, camuflava-se com precisão e extraía desse poder o charme capaz de levar todo humano a sucumbir em seus braços salgados, fazendo-os desaparecer ao mar para todo o sempre. Mas por este motivo, era suscetível a aceitar pactos com homens de mentes fortes que não caíam na tentação que era o seu canto e beleza, trocando algo de valor sentimental ao ‘contratante’ pela liberdade do mesmo (a partir dessa tese surgiu a lenda mais famosa supracitada).
Relatos verdadeiros de homens que sumiram no oceano são presenciados até hoje e ninguém descarta a possibilidade desses desaparecimentos estarem ligados à sereia de sal e, consequentemente, a Groto, O Âncora – uma união que ultrapassa as gerações e ainda desperta curiosidade.”

Outras lendas:
- Umbraço (criatura de apenas um braço que vive nas montanhas);
- No Face (crianças sem rostos do oriente);
- Hyumake (homem das unhas sangrentas da região central do continente);
- Demais lendas (clique aqui).

Fonte: Wikipedia
http://pt.wikipedia.org/wiki/Sereiadesal_gk

*Para saber mais a respeito da lenda de Groto, O Âncora e da Sereia de Sal, acesse os links em destaque no texto acima.

POR RICARDO MICHILIZZI

terça-feira, 3 de novembro de 2009

[Prólogo] Sobre as Luzes Noturnas

PRÓLOGO


O velho de paletó surrado, cinzento, apoiava-se em uma bengala com a mão direita. A esquerda, livre, revirou o interior da veste e adquiriu um relógio de bolso dourado.
Abriu o objeto com o polegar e seus olhinhos de funil esforçaram-se a enxergar os ponteiros, mesmo com o auxílio dos óculos de lentes retangulares e armação banhada a ouro.
Dezoito horas, em ponto.
As luzes da cidade acendiam-se em postes, iluminando Maluna com lâmpadas alaranjadas. Um novo início de noite.
O idoso manco esticou suas rugas faciais com um sorriso sorrateiro. Guardou o relógio no mesmo bolso, ajeitou sua cartola empoeirada na cabeça de cabelos grisalhos espalhados pelas extremidades e curvou seu pescoço acima.
Os olhinhos brilharam, quase lacrimejaram enquanto vislumbravam o crepúsculo purpúreo do entardecer em despedida.
As pupilas dilatadas flutuavam nas órbitas, como se estivesse perseguindo algum pássaro fujão.
Parecia tão fascinante observar o céu ao pôr-do-sol. Um milagre da vida que o velho agradeceria a Deus a cada dia que pôde ver o panorama transitivo em que a manhã tornava-se noite. Tudo era tão magnífico, esplendoroso, redentor...

Não para Amanda.

A menina de onze anos, cabelos lisos na altura dos ombros. A franja a lhe incomodar na testa, quase vendando suas vistas. Usava a camiseta velha de seu irmão e uma bermuda que deixava seus joelhos brancos e ralados à mostra. O nariz de pipoca franziu quando sua mão direita foi levada acima dos olhos, na tentativa de enxergar o que o velho de bengala tanto observava.
— Eles são feios, não acha, Seu Hildo?
O senhor na lateral pulou de susto. Distraído, não percebera a presença da garota ao seu lado. Ajeitou novamente sua cartola que se inclinara com o pulo e sorriu falso à pequena:
— Como disse?
Amanda era a típico criança arrogante, daquelas que não suportam quando os adultos se fazem de idiotas; disparando imediatamente:
— Para de ser besta! Ouviu muito bem o que eu disse.
O rabugento ajeitou o paletó cinza e ameaçou “bengalar” a petiz.
— Exijo respeito, sua maleducada!
Amanda não costumava levar desaforos para casa, mesmo que estes viessem de um patriarca famoso em Maluna. Mostrou a língua ao velho e bateu em retirada; os pés descalços de palmas pretejadas.
— Velho caduco! – o berro ardido e agudo da pequenina alastrou-se pela Rua Martins Fonseca com devidos ecos.
O ancião apenas ergueu a bengala ameaçadoramente, mas a pirralha já havia dobrado à esquina, rumo à Rua do Furo.
Seu Hildo arriscou uma nova olhadela ao alto. O céu já estava escuro, com espasmos lilases em pontos distintos.
O sorriso desta vez foi preocupante, mesclado com um fascínio incomum e uma alegria sigilosa:
“Será que a princesinha realmente pôde ver?”
Os olhinhos de funil piscaram com leveza. A cartola foi reajustada e a bengala auxiliou os seguintes passos.
Enquanto os comércios fechavam suas portas, demônios sobrevoavam acima das luzes noturnas.

CONTINUA...

POR RICARDO MICHILIZZI

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Have you dreamed with "This Man"?


-Algumas pessoas acreditam que esta caricatura, bem como todas as especulações em torno dela, se trata de um tipo bem criativo de divulgação de algum filme (bem ao estilo "Bruxa de Blair").
Eu, particularmente, gostaria que isto fizesse parte de um marketing viral para promover um lançamento cinematográfico.
Veja a matéria:

"Isso começou em janeiro de 2006, quando uma paciente de um psiquiatra de renome desenhou o rosto de um homem que aparecia o tempo todo em seus sonhos. A paciente disse que, por mais de uma vez, esse homem apareceu em seus sonhos dando conselhos sobre sua vida, só que ela dizia nunca ter visto o homem em sua vida.

O desenho ficou lá por cima até que, depois de uns dias, um outro paciente reconheceu o rosto e disse que ele também sonhava com aquela pessoa. E ele também dizia que jamais havia visto o tal sujeito em outro lugar que não em um sonho.

Então, o tal psiquiatra mandou o retrato para seus colegas de profissão. Em questão de meses, mais quatro pacientes reconheceram o desenho como o rosto do cara que aparece em seus sonhos. Desde então, coisa de 2 mil pessoas dizem ter sonhado com o cara, chamado pelos pacientes como “This Man”.

Isso não é só nos Estados Unidos. Existem casos de pessoas que sonharam com o cara em várias cidades do mundo: Los Angeles, Berlim, São Paulo, Teerã, Beijing, Roma, Barcelona, Estocolmo, Paris, Moscou.

O mais surpreendente de tudo é que ninguém conseguiu encontrar nenhum homem que se parecesse com o “This Man”.

Existe um site, thisman.org, que traz relatos de pessoas que já sonharam com o misterioso rosto que você vê ao lado.

E você? Já sonhou com ESTE HOMEM?"

FONTE: R7 NOTÍCIAS

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

[conto] A Lenda de Groto, O Âncora

Groto, o Âncora. Não há quem não se assuste com o termo. Chega a ser engraçado a concepção que fazem da lenda de um marinheiro morto: seria capaz um falecido homem de meia idade carregar uma âncora enferrujada que tem, talvez, o triplo de seu próprio peso? Hum... Por se tratar de uma lenda, tudo é capaz!
Nossos avós contam essa história há mais tempo que o nascimento dos primeiros reis; um causo que transpassa as gerações e ainda amedronta os pescadores, principalmente. Sim, porque são eles que enfrentam o mar todos os dias; eles que retornam à praia com o sustento e diversas histórias prontas para tornarem-nas novas lendas. Mas nenhuma é tão antiga e, ao mesmo tempo, tão contemporânea e incômoda quanto à do marinheiro Ernesto.
Dizem – ninguém está ciente da veracidade dos fatos – que Groto fora um bom homem antes de toda a fama posterior ao seu declínio moral. A traição o sucumbiu ao limbo e de lá o trouxe para uma vingança acéfala, ainda que motivada pela culpa em não ter dedicado tempo suficiente à sua família em construção. Afogou-se antes mesmo do nascimento de seu lindo filho Meroan. Este, por sua vez, fora criado por um pai postiço – Jonnah Timbrado, o melhor amigo, quase irmão, de Groto – que se envolveu com Frency Hou quando ainda era esposa do protagonista desta lenda. Exatamente por este fato, a ira apossou-se do marinheiro, tornando-o possessivo e rancoroso. Elaborou dezenas de planos maliciosos para sabotar o romance secreto dos causadores de seu descontrole emocional, falhando praticamente em todos, até que Timbrado desconfiou da perseguição e inverteu os acontecimentos, convidando seu “amigo” a uma missão nos mares, já que eram, respectivamente, comandante e tenente das embarcações portuárias e da tropa marítima. Plano por plano, seria o ambiente ideal para a finalização de suas depravações: o oceano que um dia os uniu, seria crucial para a separação que viria a seguir – um deles morreria neste dia, e não preciso dizer qual.
Em alto-mar, Jonnah fingiu afogar-se entre as águas azuis, forçando seu ex-amigo a salvá-lo. Ernesto poderia ter assistido a encenação de braços cruzados, mas sua tolice empurrou-o à vastidão anil disfarçada de “honra”. Timbrado, por sua vez, não estava ao mar – fizera um pacto com a Sereia de Sal (fruto de outra lenda que contarei em outra ocasião) – mas seu corpo deslizava sobre as águas com imensa habilidade, ao mesmo tempo, demonstrando um declínio fútil em relação ao afogamento, como se tudo soasse falso demais. Alguns marinheiros participaram da “brincadeira” como coadjuvantes do “susto” que Jonnah dava no amigo, sem perceber que a tragédia era anunciada. Groto retornava ao navio com a sereia nos braços quando o verdadeiro Timbrado fazia despencar sobre o nobre homem toneladas de uma âncora rígida, atingindo o salva-vidas no cocuruto, carregando-o ao fundo do oceano enquanto a sereia era sal puro, em pó, confundindo-se com o líquido aquoso e chacoalhante que era o mar.
A notícia da morte do comandante alastrou-se por todo o continente. Os marinheiros que presenciaram a cena culparam o tenente Timbrado e o mesmo fora julgado pela Suprema Corte como inocente, o que o motivou a fugir de Crown com a belíssima Frency Hou na garupa de seu cavalo branco; esta, por sua vez, ainda grávida.
O tempo passou e o corpo do marinheiro jamais foi encontrado.
Treze anos depois, eis que surge das profundezas do oceano, um imenso homem pálido, musculoso, revestido de musgos e corais, carregando uma gigantesca âncora enferrujada nas costas. Groto! Sim, o famoso Âncora, que voltou do desconhecido para efetivar sua vingança contra aqueles que o traiu. O problema é que, por estar morto, não tinha consciência exata de quem atacava, apenas seguiu um raciocínio demasiadamente básico: suas vítimas tinham entre quarenta e cinquenta anos – homens vividos, daqueles que estão na porta da velhice –, sendo que nenhum sobreviveu para contar a história (outros fizeram por eles).
O primeiro relato da aparição de Groto sucedeu a primeira sequencia de assassinatos – um velho bêbado, descendente de anões, disse jamais ter observado coisa tão agourenta, terrível e vingativa quanto O Âncora. Pudera, o “homem do mar” esmagava suas vítimas isento de qualquer sentimento ou culpa, utilizando a sua principal arma como objeto de destruição – a mesma que tirou-lhe a vida. Moradores da localidade, na época, diziam que Groto atravessava florestas, cidades e pântanos brumosos repetindo a mesma palavra sequencialmente: “Timbrado”. E assim, após finalmente encontrar seu inimigo e sua esposa, esmagou-o e levou a mulher ao mar como símbolo de sua derradeira ruína, quando se afundou abraçado a uma Sereia de Sal. O rastro deixado por Groto fora de treze mortes: doze masculinas, incluindo Jonnah Timbrado, e uma feminina – sua amada Frency Hou.
Meroan, o filho, sobreviveu e cresceu cercado de mistérios. O povo diz que seu pai poupou-o do extermínio apenas para que o terror perpetuasse quando algum herdeiro de seu sangue fosse tomado pelo desejo de traição, independente de qual fosse ela. Alguns homens, provavelmente traidores, perseguiram Meroan e mataram-no, pensando que este ato anularia a maldição d’O Âncora no pior dos erros cometidos por mortais. Na mesma noite, todos os vinte homens foram atacados por uma criatura em plena floresta. Sete sobreviveram, mas cometeram suicídio coletivo em alto mar um dia depois, seduzidos por uma certa sereia...
Até hoje existem descendentes de Groto que vivem às escondidas ou permeiam entre nós com outros nomes, tementes àqueles que ainda acreditam que o fim do ciclo vicioso que se tornou o sumiço de traidores durante os anos termine quando a morte do último herdeiro d’O Âncora seja efetuada. Apesar de tudo não passar de uma lenda, são poucos os que arriscam aderir à traição, por mais sutil e persuasiva que esta seja...

POR RICARDO MICHILIZZI

terça-feira, 13 de outubro de 2009

[conto] Flores no Campo Minado

A guerra deixa cicatrizes permanentes, tanto na História, quanto nas pessoas que a presenciaram cara a cara. Os olhos cerrados diante da explosão surpresa, ou pupilas dilatadas, escondidas sob a testa franzida que impulsiona a raiva do inimigo em comum: humanos como nós. A razão não é aceita, longe de ser verdadeira. Não há razão! Os tiranos a inventam e os dados são jogados ao relento; soldados nus, desmotivados por si, mas motivados por uma causa injusta, maniqueísta – em nome da Pátria!
Pátria esta que receberá a notícia de sua inevitável morte. Lutou por ela; morreu por ela... Quem é essa tal de Pátria? Apenas uma bandeira? Um símbolo? Eu não sei dizer... Não compreendo a sedução que exala esta nação para atrair nossos filhos à frente de batalha. Ainda assim, sobrevivi aos tiroteios, às bombas, aos gritos de socorro, aos olhos fixos no nada.
Pobre família a minha. Viveu na esperança do retorno de seus entes. Apenas um voltou ao lar. Incompleto. Desmembrado. Desalmado. Mutilado. Tão morto quanto seus companheiros que foram obrigados a padecer em meio ao caos de fogo, ao inferno bélico do homem contra si.
Hoje estou aqui, sentado nesta cadeira de rodas. Minha carcaça ainda vive, mas meu espírito partira junto ao batalhão de irmãos que sucumbiram à irresponsabilidade dos soberanos. Observo a imensidão com uma lágrima no olhar profundo, tentando enxergar além do que posso ver. Consigo apenas perceber o colorido da flora fumegante que brotou sobre corpos dilacerados e percebo: até mesmo flores nascem em um campo minado.

POR RICARDO MICHILIZZI

sábado, 10 de outubro de 2009

[conto] O Manual do Suicida



A capa de veludo, preta, continha detalhes em dourado nas bordas e uma camada fina de poeira decorada entre a lisura do logo estampado, sutilizando a morte contida no interior de suas 507 páginas. O nome sugestivo despertava a curiosidade de qualquer indivíduo que, por hora, tocasse os olhos naquele livro velho e surrado: “O Manual do Suicida”.
O interesse foi imediato.
Bastou o destro anelado dispersar parte do pó sobreposto às letras cintilantes e foscas; a exatidão do título era chocante. Um despertar.
A primeira página virada, encardida, vazia. A segunda, o título acima de uma data minúscula e uma anotação indecifrável, apagada, escrita com algum tipo de caneta esferográfica, talvez uma assinatura:
“19/12/1879 – Ahdek Noah Schumrashu”.
Uma nova página e um aviso dinâmico, interrogativo e persuasivo:

“És dono de si? Dono de sua vida?
Comanda teus anseios e desejos?
Respeita a vida alheia como a própria?
Cansara de percorrer o traço doloroso que é a existência?

Conforme positiva forem as respostas,
Eis aqui a receita especial que o tornará livre.
Um manual completo, passo a passo, em que o aprendiz adquire conhecimentos avançados a métodos eficazes de como proceder em sua auto-desistência.
O fim do fracasso.
O fim de um ciclo.
O fim de um laço árduo, repleto de nós desatáveis.
A vida desligada, enfim.”


Proceda por sua determinação.
Seja feita a tua vontade.
POR RICARDO MICHILIZZI

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

[conto] - Dormitório

A porta fechada. Uma fresta na janela permitia a entrada distante de uma luz ausente. A cama postada ao meio, dividindo o quarto minúsculo em dois hemisférios. De um lado uma pequena cômoda, do outro, uma escrivaninha com um computador amarelado, desbotado. Algumas tralhas se faziam presente. Tênis jogados atrás da porta e pôsteres horrendos cobrindo as paredes úmidas. Alguns deles enfeitavam-se em rugas, judiados pela infiltração que formava figuras distintas. No ímpeto da psique humana era de se esperar uma visualização demoníaca a cada olhadela de relance. Ao final, a realidade permitia perceber a verdade discutível: eram apenas paredes manchadas pela ação da natureza ou pela preguiça do homem – que podia ter arrumado a calha externa que inundava a cada temporal.
Um jovem de olhos profundos, deteriorados pela função costumeira de uma jornada de trabalho de doze horas seguidas e a maratonas de horas extras: bocejos e preguiça. Seu objetivo seria apreciar o colchão gasto e o estrado duro que judiava suas costas calejadas. Ao fechar os olhos, pretendia não ver o real mundo que o aguardava com anseio, mas um paradoxo de sonhos que o distanciasse da ilusão do viver.
O travesseiro raso, sujo, não propiciaria uma noite de bom sono, não fosse costume do bom moço, que encostava a sua cabeça comprimida naquele estofado repugnante e ainda suspirava alívios. Sequente ao selar das pálpebras, veio a escuridão com o apagar da lâmpada sobreposta no cubículo-dormitório. Os sonhos?
O pesadelo.
Discernir o paralelo entre a razão e a vertigem é algo incomum. Complexo em sua plena atividade pulsante. O coração vultoso. As têmporas afloradas. A escuridão persistente.
Os olhos não enxergam além da negridão envolvente, impulsionando a pressão sanguínea a engrenar o medo. Os dedos lateralmente agarrados aos cobertores. O suor insistindo em escorrer sobre a face perplexa, ainda que invisível.
A visão do nada à procura de uma brecha luminosa. Não há. A alcova tumular fora um dormitório em eventos antecedentes ao dedo no interruptor, ao fechar dos olhos no prelúdio do sono. O caixão: a cama. Gritar? A garganta seca impedia. Fugir? Não havia portas, janelas. A sensação de solidão era palpável. A companhia era o temor para o qual não se podia pedir ajuda. Fechar os olhos é a certeza de o escuro atormentar quando abri-los; de nada adianta piscar – o escuro, o vácuo da junção de todas as cores, estará lá. O negrito presente às pálpebras cerradas é mais confortável, ainda que a presunção de perdição não tenha desaparecido. O frio desconcertante tornava os arrepios gélidos em suores arranhados, proporcionando a impulsão em disparar-se, mas a jaula de muros, tetos e preto impediam qualquer escape. A cama: o refúgio. Haveria ali um chão sustentável? A dúvida assassinava qualquer esperança frustrada. Como parar de sonhar? Como se mover?
O medo trancafiava os músculos; e a coragem, única chave capaz de abrir as fronteiras entre o receio e a certeza, seria de grande valia. Mas onde encontrá-la quando o cadeado não é compatível? A escuridão ainda permeia naquele quadrado claustrofóbico em suas dimensões mais sinistras.
A força veio da curiosidade superior a qualquer outro descaminho que o levara à ruína. Os dedos afrouxaram entre os cobertores e a respiração, antes arfante, estabilizava-se na ambivalência de suas emoções. O pé esquerdo experimentou o denso ar ambiente enquanto procurava solidez para se apoiar. A espinha trêmula continuava sua epopéia de subidas e descidas pavorosas. A palma encontrou o chão com certa desconfiança. Parecia seguro. O pé direito posicionou-se ao lado, permitindo que o corpo do jovem ficasse ereto diante do mais vazio poço noturno, cor de piche. Um passo cauteloso. Dois passos. O terceiro encontrou o rodapé rente aos dedos miúdos e atrofiados. As mãos à frente apalparam a pintura vertical e resíduos molhados de umidade. O polegar esquerdo passou por entre papéis rasgados. Os pôsteres se desfaziam. O alívio. Estava em seu quarto. Estava acordado?
O joelho esbarrou naquilo que poderia ser a escrivaninha. As mãos puderam determinar o objeto. Realmente o era. A respiração profunda descarregou parte da tensão que o pressionava. O interruptor.
Seria mesmo necessário acender a luz?
A resposta veio com um sussurro incompreensível vindo de algum lado. O elevador de sensações fora intenso. A nuca arrepiou. A espinha contorceu. As pernas fraquejaram. O coração cedeu, disparou.
O interruptor era realmente necessário. Os dedos frenéticos tapeavam-no até que um cisco de luz faiscou: um corpo curvado, anêmico e nu padecia à lateral abaixo da janela, encarando-o com pupilas dilatadas. A umidade era sangue. Os cartazes espalhados se moviam, exaltando criaturas grotescas para fora de seu quadro. Os olhos do jovem viram mais do que podiam em menos de um segundo em que a luz piscou sobre sua cabeça. Grunhidos e gemidos agonizantes. O grito saído de sua própria garganta finalmente encontrou ar fora dos pulmões. O interruptor novamente acionado. A luz repentina tornou tudo mais claro e o quarto de dormir depreciava os mesmos problemas de infiltrações, e um encardido monitor jazia em cima da escrivaninha datada. A respiração e pulsação permaneciam ágeis. Os olhos fixos naquele mesmo canto logo se desviaram para as paredes de figuras bizarras, desta vez intactas e caricatas.
Gritar. Berrar. Espernear. Adjetivos que tornavam o momento menos angustiante. Faziam o jovem ter a falsa sensação de segurança. Extrair o medo, a raiva, a plenas cordas vocais e rasgar com voracidade cada milímetro de papel enrugado exposto que aprimorava o caos ao apagar a luz. O primeiro pôster fora arrancado com tamanha fúria, revelando o restante de alguma palavra formada atrás daqueles cartazes. Rapidamente, o restante arrancado mostrava com evidência a frase que, por mais temerosa e impactante que fosse, não conseguiu proporcionar uma nova sessão de roda-gigante ao estômago do jovem: “Eu vejo você”.
Quem?
Como?
Por quê?
Susto! O relógio despertara o jovem de um pesadelo constrangedor. Quando o devaneio se foi, as dúvidas surgiram. Já eram seis horas da manhã. Atrasado, o trabalho o aguardava sem novidades.
Averiguou com cautela cada uma das infiltrações; os pôsteres. A janela foi aberta com imenso alívio, permitindo a entrada de uma luz estonteante, viva. Aquele fora o último dia dos cartazes às paredes e não havia resquícios de frase alguma atrás deles.
Como é bom estar acordado para viver o pesadelo real e o corre-corre da vida.

Por Ricardo Michilizzi

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Arte Dois - O Assassino Branco

Mais uma arte feita por mim para um futuro livro meu.

Sinopse inventada agora:
"Branco é um vampiro. Ele acordou de um desfalecimento enforcado no meio de uma praça deserta em uma cidade fantasma.
Sem memória, encontra motivações quando vê a foto de uma menina, que estava em seu bolso.
Decidido a protegê-la, como se essa fosse a missão incial, torna cada movimento em posse da garota um martírio.
Perseguidos por uma legião de vampiros insaciáveis e pretenciosos, descobre, aos poucos, que sua missão não era exatamente o que imaginava - ao mesmo tempo, Nancy Hector (a pequena notável) encontra-se no meio de uma batalha fervorosa onde é o principal alvo".

Mais ou menos assim.
Vou elaborar mais a sinopse e, principalmente a história.

See ya!

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Arte Um - BOREAL

Dá um lig no exemplo de uma capa que criei para um futuro livro meu.
Simples e magnífico! hehe

Só não vou revelar a sinopse do romance agora porque não convém. Eu entregaria o ouro...

Por enquanto vou postando as artes que crio. E só.

domingo, 20 de setembro de 2009

O Mar Vermelho

Recebi uma penca de e-mails contendo diversas fotos sobre o "Mar Vermelho" da Dinamarca em que, principalmente, jovens participam de uma matança a golfinhos no litoral com o significado de "atingirem a maturidade"!
Se isto é verdadeiro, eu não sei, mas que é cruel, isto é.
As fotos são chocantes e todos participam de uma forma ou de outra: matando ou agindo como meros telespectadores da cena grotesca.

Aonde estão as autoridades para inibirem este tipo de "genocídio"?

Talvez estejam no meio destes tantos homens e mulheres, apreciando a coloração da água modificar como "mágica".



quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Estrada Velha

Escrevi este "conto" apenas pra colocar no perfil do orkut.
Ficou por lá um bom tempo, mas enjoei.

Chega um momento em que é necessário mudar o rumo da nossa vida como se virássemos uma esquina para seguir uma rua desconhecida. Esse mistério é a chave de nosso conhecimento, pois a partir desse novo caminho, novos lugares conheceremos, novos rostos encontraremos, novos desafios enfrentaremos... Podemos encontrar nessa estrada sinuosa alguns amigos que para trás deixamos, e mesmo assim, permaneceremos com o nossos corações aberto a novos segredos e poderemos compartilhar os antigos e, talvez divertidos, aprendizados que guardamos...
Podemos nos deparar com coisas horrendas, sofrimentos ou problemas corriqueiros, mas saberemos lidar com eles com mais intensidade porque nós ARRISCAMOS... Viramos aquela esquina que jamais imaginaríamos virar... Quebramos a rotina, saímos do nosso itinerário que erroneamente tornamos monótono por não sabermos viver...
Aquela esquina e aquela estrada sempre estiveram ali, só percebemos seus encantos, seus fascínios e suas destrezas quando decidimos mudar as regras da nossa vida e andamos pela nova “velha rua”...
Descobrimos com isso que já conhecíamos aquela ultrapassada avenida, que para nós, ainda soa tão atual... Deixamos de lado o nosso medo do passado, o nosso orgulho, e dedicamo-nos à perseverança do presente: aquela esquina jamais seria a mesma... Uma rua que nos leva ao mesmo destino anterior, tão árdua e cansativa e ao mesmo tempo tão compensadora e repleta de novidades...
Quando esta estrada se tornar surrada, nunca a abandonaremos por completo, mas com certeza, tomaremos novos caminhos... Viraremos novas esquinas, mesmo passando, uma vez ou outra, nas vielas que antes recebiam nossos apressados passos!

Por RICARDO MICHILIZZI

[Conto] ÁRVORE FILOSOFAL – A LENDA DA TUPUACA (RUNAS PERDIDAS DE URAMESH)

Os olhos brilhantes, dourados, apreciavam a relutância do objeto em mãos a cintilar na escuridão que circundava a fornalha acesa. Os dentes careados do alquimista saltavam à arcada. O sorriso a triunfar seu fascínio. Os longos cabelos cor de banana titubeavam eufóricos, curvados sobre as mãos trêmulas do molambento embriagado que segurava com firmeza o rijo pedaço de um rochedo minúsculo, incolor, de intensa luminosidade.
A pedra filosofal.
O simples fato de ter conseguido transformar uma lasca maleável de ouro na fórmula mais desejada de todos os alquimistas frustrados de Aatuma era motivo suficiente para passar noites na sarjeta após seguidas sessões comemorativas e muito rum-noscaz em bares camponeses.
O problema da embriaguez está na descoberta da ressaca, onde toda a verdade encontra o subconsciente, revelando o erro cometido enquanto alterado: sua boca grande, suja e linguaruda fofocou sua majestosa obra.
Logo seria caçado por uma legião de predadores.
A fuga permitiu ao alquimista fedorento carregar apenas sua espada auto-forjada e um saquinho bem amarrado, tendo em seu conteúdo uma pedra descolorida.
Na mesma noite, sua morada fora incendiada posteriormente a um saqueio realizado por caçadores de recompensas dos arredores da cidadela de Yvuana; todos com o mesmo objetivo: possuir o minúsculo rochedo mágico que Goako Mull, o deserdado alquimista fujão, criara.
Obcecados, fundaram a Aliança Filosofal – uma forte infantaria camponesa que continha membros em diversos pontos estratégicos do continente aatumano. O alquimista não teria bifurcações a seguir. Estava, praticamente, encurralado.
A desesperada busca interior de Goako surgia a cada furtivo passo que dava em meio a vilarejos. Adquiriu autoconhecimento enquanto permanecia na penumbra, agindo entre as sombras e se alimentando de monitores – seres asquerosos e subterrâneos, semelhantes a répteis humanos, canibais, e que também devoravam escravos gioneses, sua melhor refeição; transformou-se em um homem reflexivo e habilidoso, aprendendo com o ofício inevitável em permanecer sigiloso durante sua jornada ambivalente, na corda bamba entre o bem e o mal; a verdade e a farsa; a vida e a morte.
O ponto final de seu martírio: Tupuaca. Cidade interiorana famosa por sua população traidora.
Viu-se em um beco sem saída. A linha final. O desfecho.
Ninguém queria a sua cabeça. Todos queriam a sua pedra.
Mas todos desejaram a sua cabeça quando não encontraram a bendita com o alquimista soturno. Uma aura negra o envolvia – resultado de constante perigo vivido, de psique afetada e de um sentimentalismo alheio ignorante e egoísta. Não existia mais aquela ingenuidade no olhar. Tudo se transformara em ódio, repulsa.
Incompatibilidade obsessiva.
Gigantes e machados a lhe ameaçar com tamanha superioridade e subestimação a sua pessoa; ali, encolhido ao centro de um círculo muscular. Ânimos aflorados, circundando o frenesi anterior à captura da presa.
Goako retirou a pedra filosofal do saquinho gasto e ergueu-a.
Sim, estava com a preciosa. A cobiçada. Era hábito da mesma tornar-se invisível quando ameaçada. Uma poderosa desconhecida.
Os olhos devoradores avançaram em lâminas e urros. A fúria chegara ao ápice: a multidão raivosa; gladiadores hostis; confundiam-se dentre o redemoinho de hormônios vingativos, gulosos, a se chocar. No âmbito de fatiar o desgasto alquimista e conquistar a tão sonhada pedra filosofal, aquela que se perdera ao chão de pesados pés entrelaçados, sugada ao solo terroso que estremeceu eficaz.
Uma poeira densa ergueu-se sorrateira e pairou a meia-cintura dos homens aglomerados e silenciosos. A curiosidade era perceptível. O tremor incessante fez surgir, logo abaixo do corpo estático de Goako Mull, um caule translúcido que formou galhos envolventes, erguendo-o alguns metros acima das cabeças vertiginosas dos guerreiros.
Numa velocidade impressionante, brotou-se ali uma árvore que, a certo ponto, imobilizou-se e ganhou uma coloração naturalmente marrom-esmeralda, em musgos e lodo.

Relatos descritos em antigas runas dão diferentes desfechos à mesma história, sendo apenas uma considerada verdadeira: Goako fora engolido pela planta e seu sangue se fundiu entre a seiva viva e seu espírito jaz por entre as raízes, folhas e galhos regeneradores. Naquela fatídica data vespertina, os guerreiros foram amaldiçoados com uma magia esverdeada que se exalou da poeira nebulosa que pairava ao local, esforçando-os a cometerem suicídio coletivo, manchando as terras da cidade com o sangue dos derrotados.
A árvore, por sua vez, tornou-se sinônimo de superstições e, reza a lenda, que seus galhos contêm poderes inimagináveis e que, se fundidos a esferas filosofais artificiais, adotam a magia acoplada aos conhecimentos de seu dominador.
Desde então, alquimistas nunca conseguiram descobrir a perfeita fórmula para a elaboração da pedra filosofal, mas encontraram uma finalidade aos seus fracassos com a ajuda de um galho rústico de “árvore tupuaca”. Criava-se assim uma nova arma, ainda que rara, para adornar imperadores, senadores e outros poderosos governantes de Aatuma, dando-lhes a sensação real de soberania e tirania aflorada.
Mas o segredo do sucesso não permanece em sigilo por muito tempo.
A guerra caminha lado a lado com a revelação de uma possível profecia escrita por Efiliseu Volgar, e a conquista de território entre duas raças inimigas farão a incrível árvore imortal ser abalada com a degradação de sua vitalidade ao longo de séculos de abusos e desejos de expansão que fogem à regra, ainda que seus galhos se regenerem a cada esquartejo.
A magia criada pelo homem pode ser superior àquela existente na natureza.
Que digam os alquimistas: desafiam a hierarquia divina com suas habilidades sobre-humanas e desorganizam o equilíbrio entre Ôner e as Nuvens de Saboá, colocando Hur em um atrito infindável com o Deus Maior Allawar.
O alimento perfeito a uma guerra devastadora, cheia de luzes e trevas, resultado de uma descoberta transformadora.

Baseado em trechos históricos de Runa de Yavar – Tomo XII
Extraído do livro “O Cristal Sereno: As Arestas Temporais”
Escrito por Efiliseu Volgar – profeta, alquimista, mago, astrofísico e escritor.
Outono, meados da Era Saxônica Pradus.
Uramesh, Aatuma.

Por RICARDO MICHILIZZI

[Conto] 13

“13 horas e 13 minutos. Não contei, mas tenho a sensação esquisita de que caminhei 13 passos até esbarrar-me com um garoto que aparentava 13 anos de idade. Ele estava com uma camiseta branca, com o número 13 estampado nas costas. Eu estava na Avenida Treze de Maio. Tremo com estas coincidências.
Vi um homem comprar uma revista, pagando o dono da banca de jornal com uma nota de 20. Notei o troco: 13 reais. O jogo de futebol que rolava na TV do estabelecimento estava nos exatos 13 minutos do segundo tempo. Pura matemática: o total de tempo de um jogo é de 90 minutos, 45 para cada parte. Se contarmos como um todo: 13 minutos do segundo mais os 45 do primeiro = 58 minutos transcorridos de jogo. Daí surge o tal número. Sim, ele mesmo: 5+8=13. Treze! Treze!
Lembrei-me, hoje é dia 1º de março de 2009. Ufa! Foi quando abri os olhos.
O relógio apontava 13 horas e 13 minutos. Dèja vu: estou no mesmo lugar e vejo o garoto se aproximar.
Na banca de jornal à frente, um homem paga uma revista com 20 reais. Não preciso de treze motivos para respirar fundo e acalmar minha pulsação.”

A volta dos que não foram

Achei que este blog tinha morrido!
Fazia tanto tempo que não o visitava. Estava com saudades.
Na verdade, não via utilidade a ele até pouco tempo, quando me deparei com uma certa legião de escritores de fantasia! :D

A partir de hoje postarei contos e outras bahaças por aqui.

E viva a internet \o/